quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Condição

Da minha janela
com grades
avisto o jardim

Se crescer
alcanço a maçaneta
abro a porta
e caminho
inúmeros passos
até lá.

Se ficar pequena
bem pequenina
passo por entre as grades
e então meus pés
pousarão suaves
e rápidos
sobre o verde
tranquilo.

sábado, 5 de junho de 2010

Explicação

O problema não é
Ser mulher
E ter de usar salto alto
E cuidar da casa
E levar os filhos para a escola
E ter que trabalhar infinitamente para ser reconhecida
E usar maquiagem sempre
E sofrer dores terríveis para ficar bonita
E passar mensalmente pela terrível TPM
E ficar em dúvida sobre tomar a iniciativa
E executar mil coisas ao mesmo tempo
E ser romântica
E esperar o melhor de tudo e de todos
E se permitir ficar melancólica às vezes
E acreditar no amor
E sonhar com o príncipe encantado
E reparar e ser reparada pelas outras mulheres
E falar a todo momento
E rir quando se tem vontade de chorar
E ser uma contradição eterna...

NÃO!

O problema É (e sempre será)
A culpa que está intrínseca
À função de ser mulher.
Se fazemos, se somos
Sentimos culpa.
Se não fazemos, se não somos
Também sentimos culpa.
E por isto
Seremos sempre
Um dilema
Uma dicotomia
Constante!


Polliana Dias

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Eu faço mágica, e você?

Acredito que a maior mágica que um ser humano pode executar é o processo de leitura-escrita. Quando crianças, somos apresentados a um emaranhado de símbolos dispersos em todos os cantos das nossas vidas, pra onde olhamos, lá estão eles em conjuntos infinitos, se juntando, se separando, numa verdadeira dança misteriosa. Ainda crianças, ficamos curiosos por desvendar os símbolos, por saber o que eles têm a dizer. Quando chega a hora, o fascínio toma conta de nós. Um tanto trôpegos, rumamos ao um mundo desconhecido de alfabeto, sílabas, palavras, frases, pontuação, textos, para que este mundo desconhecido nos traga o conhecimento. Se pararmos para pensar parece lógica, o som de uma letra com outra letra forma uma sílaba, sílabas formam palavras e por aí vai. Mas não há nada de lógica, é mágica, ler é magia pura. Num dia as palavras são só símbolos em conjunto e de repente, no outro dia, estão de mãos dadas para desvendar um mundo diferente, são mais do que palavras, são significante e significado em um só corpo, são som e conceito fazendo amor e parindo o conhecimento. Decodificar os símbolos é mágica incrível, mais mágico ainda é poder codificar mensagens para outro decodificar e promover assim o processo leitura-escrita.

Tenho verdadeira adoração pela leitura e profunda veneração pela escrita, por isso me entristeço quando me deparo com uma pessoa que não sabe ler. A minha vontade é de encaminhar esta pessoa para escola ou de eu mesma ali, de imediato, fazer a mágica da leitura se desvendar diante dos olhos dela. Pena que não é tão fácil assim. Embora o governo tenha criado programas de educação de jovens e adultos, ainda é fácil se deparar com pessoas analfabetas, sobretudo no campo. A necessidade de ganhar a vida cedo por causa das dificuldades financeiras afastou, em tempos passados, muitas pessoas da escola e estas se dirigiram para o trabalho árduo, sobretudo braçal. Porém, hoje, com estes programas do governo, elas poderiam facilmente voltar a escola, e muitas voltaram e aprenderam a mágica das palavras, algumas ainda se inibem, se constrangem somente pelo fato de terem que assumir publicamente que desconhecem a simbologia das palavras. É difícil de acreditar que em pleno século XXI, no ano de 2010, haja pessoas analfabetas, mas infelizmente existem e o pior de tudo é saber que elas não estão sozinhas, veem acompanhadas das iletradas, pois assim como o governo, muitos dos que ensinam e muitos dos que aprendem, acreditam que ler e escrever é somente decodificar e codificar as letras, e creem nisso erroneamente. Ler e escrever ultrapassa os códigos, entra na esfera do significado, da compreensão, da reflexão, da imaginação. Devido a isto há tantas pessoas no Brasil que sabem ler, sabem escrever, mas se atrapalham na interpretação, se atormentam quando precisam despir um texto, dissecar um livro. Isto porque foram ensaiadas a trabalhar os códigos, não romperam os limites apertados do processo, são adestradas no ler e escrever.

Por isso, nós que sabemos ler, temos que ser gratos pela mágica que sabemos executar, porque tem que ser mágica, não pode ser só um truque, por isso temos que espiar por cima do muro do processo leitura-escrita, romper com os limites dos códigos, interrogar as palavras, desconfiar delas, pois muitas vezes elas estão mascaradas, desafiam nossa capacidade de desvendar. Talvez tudo que eu estou dizendo possa parecer maluquice, insanidade, mas pare e pense em como seria sua vida se as palavras em todos os cantos fossem um emaranhado de símbolos secretos? Se somos capazes de decifrar os símbolos, temos também de ser capazes de dar sentido às palavras, de compreendê-las, de nos apropriarmos do que lemos, escrevemos e falamos, porque a palavra é tudo isso, ela é junção de símbolo e som, e mais, de sentido! A palavra é poderosa para quem sabe dominá-la e a leitura é arma vigorosa em tempos de guerra entre a banalidade e a futilidade.

Por isso hasteio a bandeira do processo de leitura-escrita, defendo a mágica de ler como um milagre que recebemos e por isso deve ser valorizado, vangloriado, pois é graças a este processo que um mundo novo se apresenta para nós todos os dias, é devido a esta codificação e decodificação que descortinamos a sabedoria, é pelas palavras, tantas vezes enfadonhas e cansativas, que conseguimos sair dos porões da ignorância e caminhar para a luz do conhecimento e fazer parte do mundo.
Antes de achar este texto longo, julgar um livro como chato antes de ler, abominar qualquer tipo de leitura, peço somente que haja uma reflexão sobre como a sua vida seria sem o movimento que a leitura provoca, onde você estaria se não soubesse ler, que tipo de pessoa você pode ser se fizer da leitura um prazer? Aproveite também para pensar no quão marginalizadas são as pessoas que não sabem fazer a mágica de codificar e decodificar as tão cansativas palavras?

Milagres e mágicas acontecem a todo momento, porém, não temos olhos aguçados para enxergá-los, tão pouco sensibilidade treinada para compreendê-los. Só nos damos conta de que eles existem, e são simples, até que no deparamos com quem tem menos do que nós.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Súplica










Pai
me faz pequena de novo
ser grande é ilusão
me torna criança por dentro
me cura de ser adulta!

Pai
me livra dessa armadura
de sobriedade
me faz sábia sem carregar
fardos de sobriedade!

Pai
me transforma em alegria
brinca comigo
me deixa pensar que o mundo
é um parque de diversão colorido!

Pai
me devolve à infância
mas me resguarda de ser infantil
me permita escutar a música agradável
que emana dos risos
me contagia de emoção!

Pai
me purifica das ambições
da maturidade
me suja de serenidade e paz
lava meus olhos
me faz enxergar as belezas misteriosas
da natureza!

Pai
me faz transbordar de curiosidade
para todo o sempre
para todo o sempre
eu descobrir o infinito
de maravilhas criado
para mim!



Polliana Dias

domingo, 11 de abril de 2010

Divagações

Inspiração é quando
A alma acorda
De um sono longo.

Alegria é quando
A alma sai pra
Dançar dentro do corpo

Solidão é quando
A alma não acha
Onde aconchegar os sentimentos

Sonho é quando
A alma se liberta
E faz o que quer

Sonho é (ainda) quando
A alma deseja sem rédeas
Com impulso e fervor

Razão é quando
A alma dorme
Num sono quase mortífero

Sabedoria é quando
A alma sente
E por isso aprende

Angústia é quando
A alma não enxerga
A luz na incerteza

Loucura é quando
A alma se rebela
E açoita a razão

Choro é quando
A alma se lava
Das impurezas do mundo

Coração é o lugar
Que a alma encontrou
Para morar

Beijo é o caminho
Que a alma percorre
Para visitar outro coração

Amor é quando
A alma gosta do beijo
E passa a morar
Em dois corações.

Polliana Dias

Um certo Rubem Alves


Talvez este nome: Rubem Alves, não seja tão familiar. Ele não tem a popularidade do Paulo Coelho, mas o Pedro Bial falou nele no BBB10, sinal de que muitas pessoas, e pessoas importantes, já desembrulharam um livro seu. Sim, exatamente isso, desembrulhar um livro-presente, pois a sua literatura, simples, cotidiana, nostálgica, é um agrado para qualquer leitor.
Eu conheci seu trabalho na faculdade, textos belíssimos falando sobre o trabalho do educador. Fiquei impressionada, pois eu estava ali, sentada num banco de faculdade com uma mochila de idealismo sobre o meu colo e de repente me vem um texto falando que professor é diferente de educador, era tudo que eu precisava ouvir para seguir a diante com a minha bagagem romântica. Segurei no dedinho do Rubem Alves e segui rumo ao meu diploma de educadora.

A arte de educar não aconteceu, segui outros rumos, nem sempre os ventos compreendem nossas aspirações e sopram em desvio, nos empurrando para outros caminhos (talvez os certos). Eu acabei me deixando desviar, mas sem me corromper, a minha mochila de idealismo cresceu, se transformou em mala das grandes e Rubem Alves contribuiu muito para isso. Passei a ler muitos dos seus textos e fui ficando apaixonada pela surpresa que as palavras dele me causavam, uma surpresa de ver coisas que pensava, que sentia, que refletia, tudo ali, diante dos meus olhos num livro.

Até que um dia ele veio à minha cidade, Rubem Alves, o escritor! Fiquei alucinada, um êxtase tomou conta de mim, finalmente eu veria um escritor de que gosto tanto ao vivo, em cores, tão perto, o mínimo que gostaria era de tirar uma foto, fui preparadíssima para a palestra.
Chegando lá já não tinha mais lugar na frente, o evento era para educadores no presente e no futuro, salão completamente lotado, muitos ouvidos ansiosos. Eu me sentei longe do palco, mas saboreei cada palavra, cada história, cada gesto, cada aforismo... e queria tirar uma foto para registrar o momento... mas não foi possível. Ele se justificou dizendo que estava adoentado e por isso não tiraria fotos. O jeito foi me conformar e ir embora mastigando lentamente tudo que ouvi para o cérebro digerir os melhores momentos e depois arquivar o gosto das melhores histórias na minha memória.

Mas não sosseguei, quando fiquei sabendo que um amigo, pelo intermédio de sua irmã, foi ao hotel e conversou com o Rubem Alves, eu quase sucumbi. Ele sabia da minha admiração pelo escritor e nem me chamou para ir junto, por isso disse que só o perdoaria se ele conseguisse o e-mail do Rubem para eu enviar meus textos. Ele conseguiu o e-mail da editora que publica os livros. Eu, eu não tive coragem de enviar. Muitas vezes olhei para o e-mail, até comecei a digitar algumas palavras cordiais, mas desisti em seguida, pois como sabia que ele não seria o único a ver o conteúdo enviado, resolvi pensar melhor no assunto. Escrever, às vezes, é como tirar a roupa. Dependendo da pessoa que nos lê, dá vergonha ou não de nos despir. Se for uma pessoa querida, a vergonha é mínima, mas existe. Se for uma pessoa desconhecida, a vergonha é enorme, é como tirar a roupa para o médico e ser examinado. Mas quem se envereda pelo caminho da escrita, da literatura melhor dizendo, tem que ser sem vergonha, tirar a roupa de uma vez e sair correndo de mãos dadas com as palavras que pôs no mundo.

Quando ainda estava na dúvida se enviava ou não o e-mail para o Rubem Alves, ganhei de aniversário um livro de sua autoria. O livro, faço questão de citar, tem como título “O velho que acordou menino” e faz parte das memórias de infância de Rubem. Isso sim que eu chamo de tirar a roupa, o autor consegue se despir de tal forma que impressiona e emociona. A infância do escritor está nua neste livro e ao ler, é possível tirar a roupa de adulto que nos propomos a vestir e retornar à pequenez grandiosa da infância.

Enquanto lia o livro, ficava mais encantada com Rubem Alves e entrei no seu site oficial. Entre tantos textos, escolhi, aleatoriamente, logo um que o escritor fala que não gosta de receber textos de outras pessoas para fazer considerações. Ufa! Ainda bem que não enviei os meus, fiz bem em esperar e pensar mais um pouco antes de tirar a roupa.

Pode ser que um dia meus textos cheguem até ele e pode ser que um dia possamos conversar, ou quem sabe tirar uma foto após uma palestra. Se isto não acontecer, eu seguirei lendo Rubem Alves da mesma maneira: sorvendo cada palavra com atenção e admiração. Seguirei aprendendo com suas histórias que me inspiram a brincar com as palavras, na esperança que um dia elas brinquem comigo e transformem a brincadeira em ofício. Para isto acontecer eu só preciso ficar sem vergonha de vez e arrancar a roupa das minhas palavras para quem quiser ver e ler, mesmo sabendo do risco que corro, como disse bem o Rubem: “Tristeza eu tenho porque muitas das coisas que moram na minha alma não podem ser comunicadas. Por mais que eu diga e explique, quem ouve não entende”. Mas é preciso dizer, explicar e arrancar a roupa quantas vezes for preciso, pois sempre haverá alguém com olhos atentos para tentar entender e alma a postos para aceitar a loucura de quem se atreve a caminhar com e para as palavras, pois como o mesmo autor disse: “Pode ser que coisa dita não seja entendida, mas o sentimento que mora nos vãos das palavras, esse sentimento é sentido”.

Polliana Dias

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Sobre frutos e pedradas

Kalil Gibran é um sábio escritor libanês falecido em 1931, porém, como os sábios e como os escritores, deixou um legado de valor intelectual incalculável. Eu não o conhecia, embora seja uma admiradora incansável de literatura, jamais havia lido nada de sua autoria, tão pouco ao seu respeito. Mas a vida conhece meios ignorados e surpreendentes de nos mostrar novidades, isto é, quando estamos com o espírito disposto a aceitar o desconhecido para evoluir. Tenho um colega de trabalho, um jovem senhor muito culto e também muito sábio, que fez a gentileza de me presentear com um livro deste autor: O Profeta. Este livro deve ser o mais conhecido de Gibran devido à sabedoria que emana das palavras gravadas nele, é um livro simplesmente encantador. Tempos mais tarde, este mesmo colega de trabalho, o Sr. Antônio de Pádua, meu vizinho de mesa, me presenteou com outro livro de Gibran, este contém os mais belos pensamentos do autor, lá li uma frase impactante que guardei num canto especial da minha memória, parece que estava prevendo que em algum momento ela me seria muito valiosa.
Há momentos na vida em que sentimos que tudo é luta, tudo é dor, tudo é sofrimento. É como se de repente a vida dissesse: “a hora do recreio acabou”, então ela aperta aquela sirene furiosa e começa a etapa de provações. É dada a largada então para uma avaliação pesada, um intenso vestibular da sobrevivência, várias provas de uma só vez, não há tempo para decidir qual delas fazer, todas precisam ser resolvidas, muitas vezes sem cola, sem ajuda de professor, sem a certeza de uma recuperação mais tarde caso haja uma bomba. Quando esses momentos chegam, o sentimento é de total impotência e desespero, é como se todos os problemas encharcassem todos os sonhos que vão ficando miúdos a ponto de escorregarem para um bueiro escuro. A enxurrada de acontecimentos ruins é capaz de fazer desmoronar tijolos e tijolos de batalha que estavam empilhados esperando pelo cimento de boas notícias. Foi num desses momentos de tormenta, em que vi muitos tijolos jogados ao chão, alguns quebrados, outros lascados, que a frase de Kalil Gibran ressoou na minha mente: “Somente as árvores que têm frutos são sacudidas e apedrejadas em busca de alimento”, ela está no livro “Os mais belos pensamentos de Gibran”, e refletiu esperança em meio ao caos.
É uma bela metáfora. A árvore que não dá frutos nem é notada, tão pouco é procurada, salvo quando o momento é de procura por uma sombra, mas é um momento passageiro, porque o sol muda de posição e a sombra pode não servir por muito tempo. Mas a árvore que produz frutos é vigiada enquanto floresce, quando começa dar os primeiros sinais de frutos já é cobiçada, quando os frutos aparecem então, não duram muito tempo. Assim, no momento nublado pelo qual passava, quando a visão fica turva por causa da tempestade, quando o desespero rouba o sorriso do rosto, quando o choro representa a dor de ver sonhos perdidos, esta frase trouxe um raio de sol e mudou todo o cenário. Através dela percebi que o apedrejamento que tantas vezes sofro, o qual será contínuo, faz com que o melhor de mim venha à tona. As pedradas são as decepções, os vários “nãos” que recebo quando espero um sim, os elogios e o reconhecimento que quase sempre não chegam, enfim, tudo isso faz com que meus frutos caíam quando recebo este saculejo, e se este saculejo acontece é para me deixar ativa no grande processo natural de evolução. Aprendemos muito mais num momento ruim, produzimos muito mais num momento de crise do que num momento de total plenitude. A vida quer nossos frutos, quer o melhor que pudermos oferecer, os frutos são a certeza do movimento, é um degrau na escada do crescimento. Acredito que quantos mais frutos retirarem de mim e a minha reação para com elas, minhas atitudes para com sua caída, serão os passos decisivos rumo à grande estrada da sabedoria. Sabedoria essa que Kalil Gibran esbanja em suas palavras.
A vida é movimento e nos movimentos da vida os frutos nascem, e em algum momento eles serão retirados de nós para produzir alimento, é uma rotação dolorida, mas edificante. Há uma canção interpretada pela Maria Bethânia, escrita por Guilherme Arantes, intitulada de Brincar de Viver, que dialoga com este texto, cujo refrão diz: “Você verá que é mesmo assim / que a história não tem fim / continua sempre que você responde sim / à sua imaginação / a arte de sorrir / cada vez que o mundo diz não.” Como eu disse antes, a vida conhece maneiras surpreendentes de nos fazer evoluir.

Polliana Dias Ferreira
06/12/2009